Capítulo 36
XXXV
Critica
Nós não somos d'aquelles que exageradamente comdemnam o clero.
Nada mais santo, nada mais suavemente consolador do que o bom padre, especie de medianeiro entre Deus e os homens.
Para quem não tem um pai natural; para aquelles que a Providencia exilou do seu lado, e que a miseria acolheu no seu seio; para aquelles que, longe do ruido e das alegrias do mundo, a sós comsigo mesmo sentem o gottejar das proprias chagas; para os desgraçados, para os infelizes, para os tristes, o padre, pela sua apparencia christãmente cariciadora, é mais do que um companheiro, porque é um pai, enviado pelos anjos do céu aos anjos da terra.
Não foram um simples vicio, uma vã ostentação, e um estulto prurido que nos levaram a condemnar aquillo que, por sua natureza, deve ser exemplar, vivo e sacro-santo.
Não! Se condemnámos o máu padre, como planta nociva á humanidade, foi por um dever.
Quem tem irmãos, e filhas e esposa, não póde existir ao acaso, sem a necessaria superintendencia em todos os actos da sua vida, d'ellas.
A mulher, que do collegio não tirou a educação conveniente, que um dia experimentou a immoralidade do confessionario e os espinhos do mundo, póde ser tudo, menos uma esposa, menos uma irmã, menos uma mãe.
O padre toma parte nas scenas mais luctuosas da familia: se adoecemos, é elle que nos traz o balsamo ao espirito em trévas; se desesperamos, é elle que nos faz ver o iris da bonança; se hesitamos, é elle que nos encaminha e nos dirige.
Então, e porisso mesmo, é que o padre deve ser um bom homem.
O esboço que no precedente capitulo deixámos delineado, posto que excepção, foi por nós fielmente observado.
Que se não illudam os espiritos timoratos e frageis. Quando máu, ninguem mais severamente merece ser condemnado do que o padre.
Nas aldeias os exemplos multiplicam-se. A ociosidade, por um lado, e o celibato, por outro, muito têm concorrido para essa cadeia de lorpesas, a cada passo relatadas na imprensa e nas differentes casas de reuniões publicas.
O fanatismo nunca foi religião. Seguir os preceitos do Evangelho, não é perfilhar as doutrinas do sr. Sousa Monteiro nem as diatribes da
Palavra.
Amae-vos uns aos outros como eu vos amei--disse Christo.
Amemo-nos, sim, mas sem corrupção, sem egoismo, sem impuresa.
Que a esposa seja uma conselheira de seu marido e uma perceptora de seus filhos--tal deve ser o desejo do bom padre.--Porque um padre é acima de tudo um educador, e como tal carece de muita illustração, de muito bom senso e de muita heroicidade.
Se os rapases não podem satisfazer a esta nobre missão, escolham-se os velhos. Se com o clero periga a honestidade das mulheres, acautellem-se os homens, e aprendam por uma vez a distinguir o bom do mau, aquillo que lhes convém d'aquillo que lhes não convém.
D'outro modo continuaremos eternamente divididos, odiando-nos como inimigos, e pelejando uns contra aos outros, cegamente, loucamente, sem ideal, sem raciocinio e sem vontade.