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Dois CoraçÔes

por AnĂŽnimo

Capitulo 1

VocĂȘ morreu.

Sim, Ă© certeza de que vocĂȘ morreu, tudo estĂĄ escuro e vocĂȘ jĂĄ viu sua breve vida passar diante de seus olhos, sem qualquer realização digna de menção. Mas, espere, vocĂȘ nĂŁo pode morrer. E todos os seus sonhos? E quem irĂĄ cuidar de seu filho? O traste do pai dele? Ele tem apenas quatro anos!

EntĂŁo, de repente, de uma hora para outra, vocĂȘ abre o olho e, sem saber como nem por quĂȘ, estĂĄ olhando para o cĂ©u. NĂŁo Ă© um cĂ©u lĂĄ muito bonito, mas Ă© o melhor cĂ©u que se pode esperar em plena quinta-feira de manhĂŁ de uma cidade poluĂ­da como aquela.

VocĂȘ vĂȘ do seu lado direito uma ĂĄrvore. Aquele tipo de ĂĄrvore teimosa, plantada por alguĂ©m hĂĄ muito tempo atrĂĄs. Aquele tipo de ĂĄrvore que insiste em viver, mesmo naquele espaço quadrado de cinquenta centĂ­metros que alguĂ©m, por puro sadismo ou obedecendo a alguma regra estĂșpida da prefeitura, lhe reservou na calçada concretada de uma rua muito chique na cidade de SĂŁo Paulo. E lĂĄ ela vive, amaldiçoada por vizinhos e rodeada de fios e cabos em um amontoado horrĂ­vel, que se soma Ă s vĂĄrias outras coisas disformes da cidade. Mas, mesmo diante de toda a feiura e adversidades, a ĂĄrvore vive. SerĂĄ que vocĂȘ pode viver?

Mas, por que vocĂȘ estĂĄ olhando para a ĂĄrvore? VocĂȘ pensa. SerĂĄ que vocĂȘ estĂĄ em um cemitĂ©rio? PorĂ©m, um grito em volta lhe chama a atenção:

Moça, vocĂȘ estĂĄ bem.

Como nĂŁo houve resposta, vocĂȘ ouve novamente:

Moça, estå acordada? Quer que eu chame um médico?

Talvez aquela senhora, vestida com uma roupa de academia que claramente nĂŁo foi feita para ela, esteja falando com vocĂȘ.

VocĂȘ estĂĄ bem?

VocĂȘ olha para o lado e vĂȘ que estĂĄ caĂ­da no asfalto vermelho da faixa de ciclistas. VocĂȘ começa a raciocinar e lembra que se chama Juliana Medeiros, tem 24 anos, tem um filho lindo de quatro anos, chamado Francisco, Ă© advogada recĂ©m-aprovada na OAB e tem um monte de coisas que vocĂȘ quer conquistar. Sua cabeça, aparentemente, parece bem; tirando o fato de que vocĂȘ sabe que nĂŁo deveria estar deitada na rua.

Quanto ao seu corpo, bem, nĂŁo hĂĄ como saber deitada daquele jeito, ele parece estar todo formigando, estranho! Talvez sĂł se levantando para saber. EntĂŁo vocĂȘ se apoia e, com algum esforço, consegue ficar sentada, e olha em volta.

De fato, a não ser sua mão, arranhada e sangrando um pouco, além é claro da dor em seu traseiro, seu corpo parece estar bem.

Mais Ă  frente, vocĂȘ percebe sua bicicleta caĂ­da de um jeito estranho, mas ainda na faixa de ciclistas. O que quer que tenha acontecido, ela parece a mesma de sempre. Aquela belezinha a acompanha hĂĄ anos, sabia que nĂŁo iria deixĂĄ-la na mĂŁo. Seu celular, contudo, nĂŁo teve melhor sorte, ele jazia morto ao seu lado. Se fosse oficialmente parte do corpo humano, teria sido diagnosticado com fratura exposta, jĂĄ que vocĂȘ consegue ver grande parte dos componentes internos dele apenas olhando para a tela. Dos fones sem fio, contudo, nĂŁo hĂĄ qualquer sinal, deviam ter voado com a batida.

A batida. Agora vocĂȘ se lembra. VocĂȘ se vira para trĂĄs e vĂȘ que um homem a olha. Ele estĂĄ de pĂ©, ao lado do carro preto que havia atravessado a faixa de ciclistas, saĂ­do de uma garagem, bem na hora em que vocĂȘ estava passando. O homem Ă© alto, usa barba e bigode pequenos e bem delineados, e estĂĄ com um terno. Deve ser motorista do carro, aqueles carros sĂŁo tĂ­picos de gente que tem motorista, com aquela frente daquele tamanho.

Ele Ă© gentil e vem atĂ© vocĂȘ, genuinamente preocupado, tentando te ajudar a levantar. Ele tem um cheiro bom, cheiro de homem mais velho chique. Ele te pede sua mĂŁo e, em um sĂł impulso, consegue te colocar de pĂ©, te segurando com a outra mĂŁo pela sua cintura. Nossa, que força Ă© essa, amigo?

Quando vocĂȘ fica de pĂ©, percebe que ele Ă© bem mais alto que vocĂȘ, nĂŁo que precise de muito para isso. Mas Ă© sĂ©rio mesmo que precisa desses braços fortes para dirigir esses carros, Ă©? Impressionante! Deve ser daqueles motoristas que comem suas madames, sĂł pode.

VocĂȘ pisa com força seus dois pĂ©s no asfalto, como ele pediu. Aparentemente, seus tornozelos tambĂ©m estĂŁo bons, pelo visto foi sĂł a dor na bunda e a humilhação pelo espetacular e patĂ©tico rola por cima do carro dele.

Sim, agora vocĂȘ se lembra de como atravessou de um lado para o outro por cima da frente do carro, acompanhada de sua inseparĂĄvel bicicleta, e, por breves segundos, seus olhos se encontraram com os dele; os seus de puro desespero e os dele estupefatos pelo que estava acontecendo em cima do capĂŽ do carro que guiava. Por isso, por mais que a vergonha seja dolorida, nĂŁo hĂĄ por que ele te levar para o mĂ©dico por causa disso, como ele estĂĄ insistindo.

NĂŁo, vai que, fora quase te matar, ele vai querer fazer outra coisa com vocĂȘ no carro? SerĂĄ? Bom, sem qualquer dĂșvida, ele Ă© bonito. Agora, reparando melhor nele falando com vocĂȘ, dĂĄ para perceber que os pelos do seu bigode e barba sĂŁo castanhos com alguns fios brancos, a mesma cor do seu cabelo, que ele usava com um pequeno topete na franja e corte curto dos lados, o que combina com os olhos azuis acinzentados que ele tem. Ele deve ter ascendĂȘncia italiana ou algo do tipo.

NĂŁo dĂĄ para negar que ele Ă© bonito... Desde a separação, faz tempo que vocĂȘ nĂŁo sai com alguĂ©m que saiba o que fazer. Ficar com um homem com H maiĂșsculo e com experiĂȘncia poderia atĂ© te ajudar a se acalmar. Uma rapidinha antes do primeiro dia de trabalho no escritĂłrio novo? SĂł para tirar o nervosismo? Ai, como estou sendo safada, Ă© melhor nĂŁo. Mas o que ele estĂĄ falando?

Enfim, vocĂȘ deveria ter mais cuidado, andar de bicicleta tĂŁo rĂĄpido e de forma tĂŁo distraĂ­da Ă© perigoso.

Mas que babaca, filho de uma puta.

Vai se foder, foi vocĂȘ quem entrou na faixa de ciclista sem olhar.

Olha, menina! Eu estou sendo respeitoso com vocĂȘ.

Ai, que raiva dĂĄ quando te chamam de menina. Ser um pouco baixinha e ter essa cara redonda de bolacha traquinas, com os olhos um pouco puxadinhos, sempre tira sua credibilidade.

Respeitoso o caramba, eu estava na faixa. E eu estou atrasada para o serviço, é meu primeiro dia, não posso atrasar. Vai, anota meu PIX, é meu celular.

Oi? Que PIX?

Ah, era sĂł o que faltava. VocĂȘ toma um rola no meio da rua, seu celular, que vocĂȘ pagou sĂł uma parcela, deu perda total; fora seus fones de ouvido, que devem estar agora em algum bueiro por ali. Sua calça social, sua melhor calça social, aliĂĄs, toda rasgada no joelho; sua camisa social, toda suja. Claramente, vocĂȘ ainda vai ter que parar em algum lugar para comprar outra roupa antes de chegar ao escritĂłrio; seu sapato de andar de bicicleta, coitado, esmilinguido ao lado da sarjeta, tomando o banho que vocĂȘ precisava, e aquele babaca querendo te colocar a culpa, para vocĂȘ ficar no prejuĂ­zo, era sĂł o que faltava, mas isso nĂŁo iria ficar assim.

O seu babaca, eu sou advogada, tĂĄ. Dra. Juliana Medeiros. Se vocĂȘ nĂŁo me pagar por bem, eu vou te processar, tĂĄ ouvindo? Vou arrancar todo o dinheiro que esse seu emprego de merda te paga atĂ© vocĂȘ me ressarcir tudo o que me deve.

Ressarcir Ă© uma palavra boa, bem de advogada mesmo, que Ă© para ele ver com quem estĂĄ falando. Mas, por que ele deu um sorriso? O que Ă© engraçado? VocĂȘ se conhece, sabe que fica naquele estado quando acha que os outros estĂŁo te menosprezando.

Ah, vocĂȘ acha engraçado? EntĂŁo vou falar com o seu patrĂŁo, aĂ­ vocĂȘ perde esse sorriso idiota.

VocĂȘ vai atĂ© a parte traseira do carro e bate no vidro, exigindo que o dono do carro abaixe a janela, mas nada acontece. LĂĄ na frente, o babaca estĂĄ te olhando de um jeito estranho. Aquele maldito deve estar te achando louca. VocĂȘ nĂŁo Ă© louca. VocĂȘ estĂĄ certa, o patrĂŁo daquele babaca tem que te pagar.

Droga, nĂŁo deve ter ninguĂ©m no carro. Tudo bem, Ă© sĂł entrar com a ação e mandar citar o proprietĂĄrio do carro pela placa. É sĂł tirar a foto da placa do carro e da sua bicicleta caĂ­da na faixa de pedestres, para provar que vocĂȘ sempre esteve certa. VocĂȘ tira seu celular do bolso, mesmo sabendo que ele estĂĄ morto, pois o que importa Ă© que ele nĂŁo sabe disso. Tira duas supostas fotos da frente do carro, uma da placa, e ouve:

Dra. Juliana.

O que vocĂȘ quer?

O carro tem seguro contra terceiros, vocĂȘ nĂŁo vai ficar no prejuĂ­zo.

É bom mesmo. Mas, se bem que seria de se esperar que um carro como aquele tivesse seguro. Ele ainda fala:

Anota meu celular e me manda um oi, aĂ­ eu passo seu contato para a companhia de seguros te ligar e resolver tudo. A propĂłsito, meu nome Ă© Thiago AlcĂąntara.

Anotar onde, se o celular morreu?

Anota vocĂȘ o meu, eu estou atrasada, Ă© meu primeiro dia no escritĂłrio novo.

O babaca tira seu celular do bolso, um iPhone do Ășltimo tipo. Nossa, estĂŁo pagando bem para motoristas ultimamente, nĂ©? E, depois, ele digita os nĂșmeros do seu telefone. Quando vocĂȘ levanta a bicicleta para continuar o caminho, ouve atrĂĄs de si.

Boa sorte no emprego novo.

Ele deve ser mesmo gentil, no fim das contas, mas nĂŁo deixa de ser um pouco babaca. É isso, ele deve ser cafajeste. Mas o que importa Ă© que vocĂȘ chegue logo no serviço. O bom Ă© que o escritĂłrio fica ao lado de um shopping, dĂĄ para comprar o que vocĂȘ precisa ali do lado mesmo.

VocĂȘ pedala mais um trecho, uma parte ainda com faixa de ciclistas e outro com umas tirinhas sem sentido de asfalto, numa guerra de espaço com motos, carros e ĂŽnibus e, trinta minutos depois, chega ao shopping.

Como pode? É apenas o seu primeiro dia de trabalho e vocĂȘ jĂĄ se endividou o suficiente para o mĂȘs inteiro! Seu salĂĄrio do mĂȘs inteiro vai ser apenas para pagar a fatura do cartĂŁo que vocĂȘ gastou sĂł hoje.

É chato, mas em Ășltimo caso talvez vocĂȘ possa pedir um dinheiro emprestado para sua mĂŁe, sĂł dessa vez. NĂŁo fale sobre a batida, claro, pois se nĂŁo ela nĂŁo vai te deixar mais sair para trabalhar de bicicleta.

Morar na casa da mĂŁe, mesmo sendo adulta e com um filho, nĂŁo Ă© fĂĄcil. Às vezes, ela tem aquela mania de se meter em tudo o que diz respeito ao Francisco e a vocĂȘ. Mas vocĂȘ sabe que Ă© apenas tentando ajudar; o que, aliĂĄs, ela sempre conseguiu fazer, te ajudando a cuidar do Chico quando vocĂȘ precisou e utilizando a pensĂŁo do seu pai para dar tudo aquilo que o seu filho precisava, considerando que o traste do pai dele atĂ© hoje estĂĄ com a pensĂŁo atrasada.

É, considerando todas as cagadas que vocĂȘ fez na adolescĂȘncia, atĂ© que vocĂȘ nĂŁo ferrou tudo. Na verdade, dĂĄ atĂ© para sentir um certo orgulho de estar ali, prestes a começar em um escritĂłrio grande e renomado. O prĂ©dio, imponente, se ergue em um dos bairros mais chiques da cidade. LĂĄ dentro, seu novo escritĂłrio ocupa os trĂȘs Ășltimos andares. É, ele chama atenção de longe. A fachada de vidro reflete o cĂ©u e as avenidas marginais aos seus pĂ©s, enquanto a estrutura arredondada dĂĄ um ar moderno e sofisticado. É o tipo de lugar que parece gritar sucesso—e agora, de alguma forma, vocĂȘ faz parte disso, mas isso Ă© sĂł o começo de grandes coisas que virĂŁo.

E, finalmente, vocĂȘ chega ao seu primeiro dia de trabalho, imaginando que serĂĄ chato, como Ă© todo primeiro dia em um emprego novo. Conhecer gente nova, tentar gravar de primeira o nome, pelo menos, do seu chefe, e ficar distribuindo sorrisos enquanto passa de mesa em mesa para conhecer o que cada um faz. SĂł que a cultura daquele escritĂłrio Ă© diferente; eles, fora a apresentação restrita apenas para as pessoas do setor em que vocĂȘ vai trabalhar, promovem uma confraternização com todos os advogados novos no fim do primeiro dia, para que haja integração entre todos, uma opção bem mais acolhedora.

Assim que vocĂȘ Ă© apresentada para o departamento em que vai trabalhar, o departamento tributĂĄrio, percebe que, alĂ©m de sua chefe, todas as suas outras quatro colegas tambĂ©m sĂŁo mulheres, todas um pouco mais velhas que vocĂȘ.

Assim que vocĂȘ se sentou, Aline foi a primeira a puxar conversa, e de cara vocĂȘ sentiu que seu santo bateu com o dela. SimpĂĄtica e cheia de energia, ela se apresentou com um sorriso fĂĄcil e, em poucos minutos, jĂĄ estava imitando os advogados do escritĂłrio — mesmo aqueles que vocĂȘ ainda nem conheceu. O jeito dela Ă© naturalmente engraçado, mas o que realmente te conquista Ă© a risada: ela coloca a mĂŁo na boca e ri balançando a cabeça de um jeito quase involuntĂĄrio, fazendo seus cachos loiros cortados em chanel dançarem junto, e solta um som meio parecido com um ronco, o que torna tudo ainda mais cĂŽmico. VocĂȘ adora gente divertida, e Aline parece ser exatamente isso—alĂ©m de uma Ăłtima companhia.

Mas vocĂȘ nĂŁo perde muito tempo com apresentaçÔes e as palhaçadas dela. Sabe que precisa mostrar trabalho; afinal, ainda estĂĄ no perĂ­odo de experiĂȘncia, entĂŁo enfrenta de uma vez o trabalho que te deixaram para fazer. VocĂȘ percebe que grande parte daquilo Ă© um teste. Elas lhe dĂŁo coisas fĂĄceis e difĂ­ceis, para descobrir sua capacidade, mas vocĂȘ nĂŁo vacila e enfrenta tudo sem medo, o que Ă© o bastante para despertar olhares curiosos das suas outras colegas novas.

Enquanto trabalha, vocĂȘ recebe, pelo celular novo e barato que teve que comprar, mensagens do babaca que te atropelou de manhĂŁ, dizendo que relatou o ocorrido para a seguradora e que ela precisa de cĂłpia de alguns documentos e informaçÔes suas. VocĂȘ prontamente as envia, afinal tem pressa em receber sua indenização. SĂł que esse processo interno da seguradora nĂŁo pode demorar muito, vocĂȘ tem uma fatura do cartĂŁo para pagar, e seria tĂŁo bom nĂŁo precisar pedir para sua mĂŁe
 EntĂŁo vocĂȘ pressiona o babaca, pedindo para ele ligar na seguradora e agilizar o procedimento.

SĂł que ele nĂŁo estĂĄ mais te respondendo. Falou que tinha muita pendĂȘncia no seu serviço e que nĂŁo poderia ficar respondendo a toda hora.

Merda, vocĂȘ sente que nĂŁo vai receber o valor da indenização tĂŁo rĂĄpido quanto precisava. Enquanto isso, suas novas colegas estĂŁo cada vez mais falantes e empolgadas com a confraternização. Quem Ă© que fica tĂŁo animado assim apenas para comer uns salgados? Elas estĂŁo passando fome, Ă©?

Mas essa empolgação nĂŁo dĂĄ sinal de diminuir, pelo contrĂĄrio. À medida que a tarde se aproxima, elas ficam ainda mais elĂ©tricas, trocando olhares ansiosos e cochichando entre si que Zeus vai discursar. Elas combinam de sair uns minutos mais cedo para garantir lugar na primeira fila. O que hĂĄ com essas meninas? Quer dizer, nem todas. Uma delas, que parece ter mais ou menos a sua idade, observa tudo com evidente incĂŽmodo. Magricela, loirinha de olhos azuis, metida a modelo, ela revira os olhos e resmunga que elas deviam se conter, porque jĂĄ estava ficando ridĂ­culo. Mas ninguĂ©m dĂĄ bola, o assunto continua sendo Zeus.

Deu 10 minutos para o horĂĄrio da confraternização e, como haviam conversado, as outras trĂȘs saĂ­ram correndo para o auditĂłrio, incluindo a Aline, falando que iriam guardar lugar para vocĂȘ, deixando a advogada entojada, de nome Pietra, para trĂĄs. VocĂȘ, como nĂŁo tinha nada a ver com isso, aproveitou e enviou um ĂĄudio para o palhaço que te atropelou:

Cara, liga na seguradora, por favor, eu jĂĄ te mandei os meus documentos e as notas fiscais, pede para eles agilizarem. Se vocĂȘ nĂŁo fizer nada, eles vĂŁo demorar.

Resposta, em texto, com vocĂȘ quase chegando ao auditĂłrio:

Eu jĂĄ fiz o procedimento, eles tĂȘm o prazo deles para analisarem, nĂŁo tenho tempo para ficar ligando e apressando alguĂ©m que acabou de receber os documentos.

Filho da puta, ele quer dar uma de louco.

O Thiago, seu babaca, eu vou descobrir onde vocĂȘ trabalha e vou fazer um barraco atĂ© que vocĂȘ pague meu dinheiro, tĂĄ ouvindo? Vai dar uma de louco na puta que te pariu.

É isso, ameaça, ninguĂ©m gosta de imaginar a cena de uma louca fazendo barraco na porta do serviço. Quando vocĂȘ ouve, lĂĄ na frente do auditĂłrio:

Aqui, Ju, guardamos lugar para vocĂȘ.

Surpreendentemente, vĂĄrias outras advogadas pensaram a mesma coisa que elas e, mesmo saindo mais cedo, elas nĂŁo conseguiram um lugar na frente do auditĂłrio, tendo que se contentar com um lugar no meio.

VocĂȘ se senta e, enquanto a confraternização nĂŁo começa, fica ouvindo-as reclamar das outras advogadas do escritĂłrio que tiveram a mesma ideia que elas, atĂ© que recebe uma notificação no celular: mensagem do babaca. Aparentemente, a ameaça deu resultado, ele te respondeu rĂĄpido. VocĂȘ dĂĄ um sorriso quando vĂȘ que ele mandou um ĂĄudio. VocĂȘ discretamente coloca o telefone no ouvido e aperta para iniciar:

O menina mal-educada, vocĂȘ nĂŁo Ă© nem louca de fazer isso.

Aaaa, aquele idiota. Óbvio que vocĂȘ nĂŁo iria fazer isso. Quer dizer, era Ăłbvio atĂ© antes de ele falar que vocĂȘ nĂŁo iria fazer. Talvez vocĂȘ tenha que colocar mais credibilidade na ameaça. Melhor pesquisar o lugar onde ele trabalha. Mandar um mapa ou foto do local seria bom tambĂ©m, haha, ela vai ficar com medo e vai saber que vocĂȘ nĂŁo estĂĄ brincando. PĂŽ, Ă© uma ligação sĂł, o que custa? Para vocĂȘ nĂŁo ficar por baixo, ainda responde, em ĂĄudio: “entĂŁo espera para ver”.

As luzes do salĂŁo diminuem um pouco. À mesa no palco, sobe sua chefe, Dra. Helena, falando que a cultura do escritĂłrio Ă© a de acolher bem os novos advogados que entram para a famĂ­lia da empresa, e que naquele dia, trĂȘs novos advogados estavam entrando. Depois disso, sobe um outro advogado, que aparentemente comanda outro departamento qualquer do escritĂłrio.

Ai, que coisa chata aquela ladainha toda, melhor continuar a pesquisar discretamente naquele celular meia boca, onde aquele babaca trabalha. Ele falou que se chamava Tiago AlcĂąntara. Droga, tem um monte de Tiagos Alcantaras no paĂ­s. AĂ­ vocĂȘ recebe um cutucĂŁo de Aline na sua costela, que te fala:

Olha o Zeus.

VocĂȘ olha para o palco e vĂȘ aquele babaca de manhĂŁ, que te atropelou, ainda com o mesmo terno, subindo para a mesa e dirigindo-se ao microfone. O que ele estĂĄ fazendo ali? VocĂȘ estĂĄ confusa e pergunta:

Mas ele nĂŁo se chama Zeus.

NĂŁo, mas Ă© um Deus grego.

VocĂȘ entĂŁo percebe que aquilo era uma piada interna delas e, logo em seguida, constata que aquele cara Ă© o chefe do departamento cĂ­vel do escritĂłrio

A cara, vocĂȘ esta tao ferrada

E entao o cara que voce veio chingando a manhĂŁ toda esta no microfone discursando

estå falando como ele acha importante a cultura de integração e respeito interpessoal que o escritório mantém hå tanto tempo.

Quando ele diz respeito interpessoal, serå que ele quer dizer que não pode xingar nem ameaçar o coleguinha?

O que vocĂȘ achou desta histĂłria?

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