Capítulo 28
XXVII
Digressão
A mulher nasceu para realisar a sua felicidade por meio do matrimonio.
Sem familia, pedra angular do grande edificio, chamado humanidade, o progresso seria uma vã mentira e a civilisação um triste retrocesso.
O matrimonio é um complemento da vida humana. Se é verdade que para o desenvolvimento do corpo carecemos de alimento e de hygiène, tambem não é menos verdade que para o desenvolvimento do espirito carecemos de amisade e de consolações.
Não ter familia o mesmo é que sentir o vacuo do espirito, isto é, o isolamento da propria existencia e o horror da propria vida.
A prostituição da mulher não é simplesmente um vicio, por todos os titulos condemnavel: é mais ainda--é a ausencia da familia.
Quantas mulheres se não terão perdido á mingoa do carinho maternal!
Entrae nos bordeis. Percorrei serenamente esses antros sombrios, onde a sordidez se enlaça com o crime. Analysae o riso bestial da mulher perdida. Não! Ella não se ri, porque ella, filha bastarda de uma sociedade, que a repudia--ella, apenas, sabe contrahir-se, agitar-se, fingir, e á maneira de uma féra, aproximar-se dos que lhe trazem comida.
A mulher, que uma noite se vê sem pão, sem officio, sem familia, prostitue-se ao amanhecer.
E o mundo--que ingrato mundo!--cospe-lhe na face o negro anathema do desdem o do desamor.
Mulheres, que habitaes a lobrega mansão da desgraça, sabei que se a opinião vos condemna--o coração absolve-vos!
E depois, de que vos vale a opinião? Que vos trouxe ella na hora da desdita? Sabe condemnar-vos? Pois bem, em vez da maldição pedi-lhe virtude e amor.
Oh! a opinião! sua excellencia a deusa opinião, essa é que é de facto a grande prostituta.
A necessidade conduz a mulher pelo caminho da perdição. É um fado de todos os dias. Tambem é a necessidade quem conduz o homem pelos atalhos do crime. Sabiamol-o. Ganhar para comer é uma lei da naturesa. Se os meios são máos os fins é que são rigorosamente os mesmos. Deixemos as lamentações para os Jeremias do seculo.
A opinião que se aproxime. Mas quem é ella?--o dinheiro que suborna? a politica que corrompe? os parasitas que avassalam? o impudor que exulta?
o vicio que contamina? o luxo que esterilisa? a infamia que cresce?
E sabes tu, minha cocotte, porque te chamam mulher perdida, sem honra e sem pundonor? Pois bem, fica aprendendo--é porque tu és simplesmente uma filha da desgraça.
Queres, porém, ser honesta, virtuosa e candida?
Procura uma familia; trabalha na doce companhia de teu marido; mostra ao mundo os teus filhos--os filhos das tuas entranhas e do teu amor: que te importa depois a voz da opinião--a opinião está como a realesa, está gasta e pôdre.
A Viscondessa não estava, de certo, n'este caso. Uma boa mãe, um bom marido, um filho terno, tel-a-iam salvado do abysmo que a esperava.
E quantas vezes não é o instincto da maternidade a causa do vicio e do crime?