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A Senhora Viscondessa

por S. de Magalhaes Lima

Capítulo 30

XXIX

Indecisões

O orvalho vem do céu á terra; as lagrimas sóbem da terra ao céu.

Mulher que chora, é mulher que sabe amar.

Porque muito chorou, perdoou Christo á Magdalena do Evangelho.

As lagrimas são como o balsamo: retemperam e dulcificam.

Felizes os que sabem chorar!

A creança é como a aurora: ambas choram e ambas alegram.

Em pranto de mulher não se póde crêr--diz o rifão.

Será verdade que ás lagrimas dos olhos nem sempre correspondem as lagrimas do coração?

Chorar sempre é chorar--affirma um poeta e com razão.

Nada mais facil do que calumniar uma mulher. A nossa sociedade está colmada de espadachins. Todos os nossos rapazes se apresentam com ares de Juans Tenorios in nomine. Todos têm aventuras a contar. Poucos ha que se não julguem com direito a insultar as mulheres, coitadas! que, em verdade, pouco mais têm do que muita paciencia para os aturar.

As lagrimas, em espiritos delicados, são uma necessidade dos seus corações privilegiados. Não ha odio que ás lagrimas não cêda.

A Viscondessa via fugir-lhe a felicidade. Chorava.

A esposa tambem chora, ao ver desapparecer o navio, que, ao longe, lhe conduz o esposo querido.

Santas e doces lagrimas, que tantas vezes tendes suavisado sobre a terra os intimos e dolorosos soffrimentos, como é grandioso o vosso poder!

E vós mesmos, ó scepticos mascarados, que tão estupida e egoistamente sabeis illudir as pobres victimas da vossa stulticia--dizei-nos--em quantos escriptos, arrancados a corações honestos e indefesos, não tendes vós encontrado o vestigio de uma lagrima?

Não ha sympathia que pela lagrima não brote e se enraize.

A lagrima é como um lago, na serenidade do seu correr e no reflectir das suas imagens.

Para esse sangue d'alma--na suave expressão de um poeta--apenas ha um remedio--a consolação.

A Viscondessa chorava e continuava indecisa.

Semelhante a um arbusto, que, açoutado pelo vento, deixa cahir sobre a terra o orvalho; assim a Viscondessa, ao dar accôrdo de si, deixou cahir no seu candido seio as perolas consoladoras do seu espirito.

Bemaventuradas perolas! e oxalá que todos assim as tivessem!...

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